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LUTO NAS ARTES

Morre aos 81 anos Sebastião Salgado, um dos maiores fotógrafos do mundo

Reconhecido mundialmente por suas imagens em preto e branco que retratam a dignidade humana em situações extremas, Salgado transformou a fotografia documental e humanitária

23 MAI 2025 • POR TERO QUEIROZ • 11h22
Imagem principal
Morre Sebastião Salgado, um dos maiores fotógrafos de todos os tempos. Foto: Reprodução

O fotógrafo e ambientalista Sebastião Ribeiro Salgado Júnior, mundialmente como Sebastião Salgado, morreu aos 81 anos nesta 6ª feira (23.mai.25), em Paris, na França, onde vivia. 

Reconhecido mundialmente por suas imagens em preto e branco que retratam a dignidade humana em situações extremas, Salgado transformou a fotografia documental e humanitária, se tornando um dos maiores nomes da fotografia mundial. 

Nascido em Aimorés, Minas Gerais, em 8 de fevereiro de 1944 ele formou-se em Economia pela Universidade de São Paulo e se tornou doutor pela Universidade de Paris.

Salgado iniciou sua carreira fotográfica em 1973, aos 29 anos, após ser apresentado à fotografia por sua esposa, Lélia Wanick. Trabalhou nas agências Sygma, Gamma e Magnum Photos, onde permaneceu até 1994. Em parceria com Lélia, fundou a agência Amazonas Images, dedicada exclusivamente ao seu trabalho.

OBRA

1. Gold (1986)

Um verdadeiro formigueiro humano, é o que retrata a imagem da paisagem da mina de ouro de Serra Pelada, no Estado do Pará (município de Curionópolis). A maior mina ao céu aberto do mundo vinha sendo exploradas pela mineração com condições desumanas para oUm verdadeiro formigueiro humano, é o que retrata a imagem da paisagem da mina de ouro de Serra Pelada, no Estado do Pará (município de Curionópolis). A maior mina ao céu aberto do mundo vinha sendo exploradas pela mineração com condições desumanas. Essa imagem integra a série 'Gold', de Sebastião Salgado.  

Esta série documenta a exploração da mina de ouro de Serra Pelada, no Pará, Brasil. Salgado passou 33 dias no local, registrando as condições desumanas enfrentadas pelos trabalhadores. A série foi divulgada publicamente em 2019, apesar de ter sido realizada nos anos 1980.

2. Trabalhadores (1993)

Nessa fotografia de três trabalhadores rurais, o jovem que aparece em primeiro plano segura uma ferramenta de trabalho e temos pistas do cenário precário onde o ofício tem lugar.Nessa fotografia de três trabalhadores rurais, o jovem que aparece em primeiro plano segura uma ferramenta de trabalho e temos pistas do cenário precário onde o ofício tem lugar.

Sua primeira grande série, “Trabalhadores”, documentou o labor intenso e muitas vezes brutal de trabalhadores rurais, mineradores, pescadores e operários em diversos cantos do mundo. A série não apenas revelou as condições difíceis de quem sustenta as engrenagens da economia global, mas também exaltou a força, a resistência e a dignidade desses homens e mulheres.

O testemunho da vida dos garimpeiros em situação precária feitos pelas lentes de Sebastião Salgado geraram imagens poderosíssimas. Aqui vemos trabalhadores apinhados, sem qualquer tipo de segurança, descendo 200 metros abaixo do nível do solo através de e

Focada nos diversos ofícios ao redor do mundo, esta série destaca a dignidade e a resistência dos trabalhadores em condições adversas. Inclui imagens de pescadores na Sicília, garimpeiros na Indonésia e operários no Kuwait.

3. Êxodos (2000)

Duas mulheres castigadas pelo tempo e pelo cansaço foram as personagens escolhidas para a fotografia de Sebastião Salgado. Pouco sabemos sobre elas, apenas que são trabalhadoras migrantes de gerações distintas e que carregam na fisionomia um ar de exaustãDuas mulheres castigadas pelo tempo e pelo cansaço foram as personagens escolhidas para a fotografia de Sebastião Salgado. Pouco sabemos sobre elas, apenas que são trabalhadoras migrantes de gerações distintas e que carregam na fisionomia um ar de exaustão.

Nessa, Salgado capturou imagens sobre migrações e deslocamentos forçados causados por guerras, crises econômicas e ambientais. Em “Êxodos”, ele focou em refugiados e populações marginalizadas, expondo a brutalidade das guerras civis na África, a crise dos refugiados na Ásia e América Latina, e o impacto das políticas econômicas neoliberais.

Refugiados de origem africana acampados em condições precárias, foi esse o retrato que Sebastião Salgado escolheu eternizar. Vemos na imagem homens, mulheres e crianças amontoados em um terreno baldio sem saneamento básico e sem qualquer acesso à higiene Refugiados de origem africana acampados em condições precárias, foi esse o retrato que Sebastião Salgado escolheu eternizar. Vemos na imagem homens, mulheres e crianças amontoados em um terreno baldio sem saneamento básico e sem qualquer acesso à higiene e bens essenciais.

Salgado capturou a luta e a esperança de pessoas que foram forçadas a deixar suas terras natais devido a conflitos, desastres naturais ou perseguições.

A imagem é um impactante registro de três crianças pequenas, negras, sob uma coberta comum, apenas com parte do rosto a mostra.A imagem é um impactante registro de três crianças pequenas, negras, sob uma coberta comum, apenas com parte do rosto a mostra.

4. Gênesis (2013)

A fotografia da mata e dos dois rios que cortam a floresta mostram a imponência da natureza e um raro cenário ainda não tocado pelo homem.A fotografia da mata e dos dois rios que cortam a floresta mostram a imponência da natureza e um raro cenário ainda não tocado pelo homem.

Um tributo à natureza intocada, esta série apresenta paisagens remotas e comunidades que vivem em harmonia com o meio ambiente. Salgado documentou locais como a Amazônia, a Patagônia e a Etiópia, destacando a beleza e a fragilidade do planeta.

Esse foi um movimento que surpreendeu muitos, porque ao invés da tragédia humana, essa série exaltava a beleza e a diversidade do planeta.

Enquanto três canoas cortam o rio, uma delas em primeiro plano, a paisagem nublada ao fundo tem os elementos naturais destacados (a água através do seu reflexo e o brilho da lua). Aqui o fotógrafo brasileiro demonstra uma harmoniosa integração entre o homem e o meio.

“Gênesis” é um convite visual para refletir sobre a importância da conservação ambiental, especialmente diante das crescentes ameaças da destruição e do aquecimento global.

A mostra Gênesis, com 250 fotografias curadas por Lélia Wanick, tem percorrido uma série de grandes cidades do mundo apresentando recantos desconhecidos para grande parte das pessoas.

Sinfonia do Adeus (2017)

Nesse projeto, juntamento com o Instituto Terra, Sebastião Salgado capta os sons emitidos por troncos de árvores em extinção. O projeto destacou que atualmente existe apenas 8% da vegetação original da Mata Atlântica no mundo. Para eles, o som simboliza o 'adeus' de 140 espécies ameaçadas de extinção. Veja: 

O PRETO E BRANCO

Salgado escolheu o preto e branco como seu principal meio para imprimir dramaticidade, profundidade e atemporalidade às suas imagens. Seu uso magistral de luz e sombra, aliado a uma composição rigorosa, cria fotografias que vão além do documento: são verdadeiras obras de arte que emocionam e provocam reflexão.

Seu processo de trabalho era meticuloso e demorado, envolvendo longas expedições, paciência para captar o momento decisivo e, depois, um cuidado extremo na revelação e impressão das fotografias. A escolha do formato tradicional em filme apontava para sua busca por imprimir autenticidade e textura própria que sua obra exige.

FOTOGRAFIAS QUE MUDARAM O MUNDO

Mais do que imagens, Salgado ofereceu ao mundo uma narrativa visual sobre as grandes questões do nosso tempo: a pobreza, a migração, a devastação ambiental, a luta pela sobrevivência e a beleza da vida. Seu trabalho inspirou políticas públicas, organizações humanitárias e novos fotógrafos comprometidos com o fotojornalismo social.

AMBIENTALISTA

Juntamente com sua esposa, Lélia Wanick Salgado, ele fundou o Instituto Terra, uma organização dedicada à recuperação ambiental e à promoção da sustentabilidade. O instituto atua principalmente no Vale do Rio Doce, em Minas Gerais, com projetos de reflorestamento e revitalização de áreas degradadas. 

O local que antes era a Fazenda Bulcão, com 709,84 hectares, foi adquirida pela família de Sebastião Salgado e estava completamente degradada devido ao uso intensivo para criação de gado. Em 1998, o casal Salgado decidiu iniciar o processo de recuperação ambiental, com o apoio de parceiros como o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio) e a empresa Natura. O projeto de restauração foi elaborado pelo engenheiro florestal Renato de Jesus e, em 1998, a Fazenda Bulcão recebeu o título de RPPN, sendo a primeira área desse tipo concedida a uma propriedade totalmente degradada.

Desde então, o Instituto Terra tem se dedicado ao reflorestamento, educação ambiental e pesquisa, com o objetivo de promover o desenvolvimento sustentável na região. Até 2023, mais de 21,1 milhões de metros quadrados de áreas degradadas de Mata Atlântica no médio Rio Doce estavam em processo de recuperação, e mais de 6 milhões de mudas de espécies nativas foram produzidas em seu viveiro para abastecer tanto os plantios na RPPN Fazenda Bulcão quanto os projetos de restauração que desenvolve na região. Aqui Sebastião e Lélia fala sobre o projeto: 

O Instituto publicou uma nota de pesar: "Com imenso pesar, comunicamos o falecimento de Sebastião Salgado, nosso fundador, mestre e eterno inspirador. Sebastião foi muito mais do que um dos maiores fotógrafos de nosso tempo. Ao lado de sua companheira de vida, Lélia Deluiz Wanick Salgado, semeou esperança onde havia devastação e fez florescer a ideia de que a restauração ambiental é também um gesto profundo de amor pela humanidade. Sua lente revelou o mundo e suas contradições; sua vida, o poder da ação transformadora. Neste momento de luto, expressamos nossa solidariedade a Lélia, a seus filhos Juliano e Rodrigo, seus netos Flávio e Nara, e a todos os familiares e amigos que compartilham conosco a dor dessa perda imensa. Seguiremos honrando seu legado, cultivando a terra, a justiça e a beleza que ele tanto acreditou ser possível restaurar. Nosso eterno Tião, presente! Hoje e sempre. Instituto Terra".

RECONHECIMENTO 

Salgado recebeu inúmeros prêmios ao longo da carreira, incluindo o prestigiado W. Eugene Smith Memorial Fund, a Medalha do Centenário da Royal Photographic Society, além de ser Embaixador da Boa Vontade da UNICEF e membro da Academia de Belas Artes da França.

Seus livros foram publicados mundialmente, traduzidos para dezenas de idiomas, e suas exposições atraíram milhões de visitantes. Sua obra é parte dos acervos permanentes de museus como o MoMA (Nova York), o Centre Pompidou (Paris) e o Museu de Arte Moderna de São Paulo.

Em 2014, seu trabalho foi retratado no documentário “Sal da Terra”, indicado ao Oscar.

Em fevereiro de 2025, a escola de samba Independente de Boa Vista, de Cariacica (ES), prestou uma emocionante homenagem a Salgado no Carnaval, com o enredo “Os Olhos do Mundo – Assombros de Sebastião Salgado”, destacando sua contribuição à fotografia e à cultura