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INIMIGOS DA CULTURA

Ex-Sidagro condena Guarda, mas livra prefeita de surra a manifestantes

'Natal milionário' foi palco para agressões contra mães, idosas e um professor

4 DEZ 2025 • POR TERO QUEIROZ • 11h42
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Prefeita aciona aliado com histórico de ações contra a cultura para atribuir a responsabilidade apenas à Guarda Municipal de Campo Grande, que agrediu manifestantes contrários à gestão de Adriane Lopes. - Fotos-esq/dir:(1,2) Arquivos|(3) Tero Queiroz

A prefeita Adriane Lopes (PP), campeã em calotes à cultura, conseguiu transformar a abertura do chamado “Natal milionário” em um palco de violência contra a democracia. E, para surpresa de quem achou que ninguém a defenderia, um aliado histórico logo apareceu, jogando contra, mas sob o muro. 

Entre as manchetes que denunciavam a agressão da Guarda Civil Municipal, ressurgiu um personagem conhecido da Cultura campo-grandense: Adelaido Vila, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico e Agronegócio (SIDAGRO). A sua indignação pública, porém, compete com seu histórico de subserviência à prefeita e de ataques ao patrimônio cultural da cidade.

Hoje presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Campo Grande (CDL-CG), Adelaido quebrou o silêncio na 3ª feira (2.nov.25) para condenar a ação “truculenta” e “desmedida” da Guarda contra os manifestantes. Em vídeo divulgado nas redes sociais, disse que a violência não pode ser normalizada, especialmente porque atingiu mães, idosas e um professor — pessoas que ele classificou como “patrimônios” da cidade.

A fala seria até crível se ele não tivesse sido o principal executor de um dos mais infames ataques da prefeita à cultura local: a tentativa de sequestro do Armazém Cultural.  

Foi Adelaido quem tentou arrancar da cidade o único espaço público ativo e aberto à cultura para encaixar ali um projeto milionário e vazio: o “Partktec-CG", orçado em R$ 94 milhões. Relembre no arquivo.

À época, artistas de Campo Grande — que não contam com um teatro público decente e convivem há décadas com obras paralisadas — organizaram um abaixo-assinado com mais de 700 nomes cobrando que o Armazém permanecesse como espaço cultural. Relembre no aquivo

Como de costume, Adriane Lopes se esquivou de enfrentar os trabalhadores da cultura e colocou Adelaido como porta-voz do “Park”. O ápice do cinismo ocorreu em uma reunião no próprio Armazém, quando o ex-secretário, sem apresentar sequer um croqui do projeto, desqualificou os artistas, afirmando que a resistência deles se devia à “falta de conhecimento e compreensão”. “É um absurdo, a gente tinha que ter mais espaço para a Cultura […]. Eu entendo que não compreender como funciona não é culpa dos senhores e das senhoras... Vamos aprofundar”, disparou.

Curiosamente, o tom paternalista do discurso de então reaparece agora no vídeo em que condena a Guarda — mas, claro, sem citar o nome da prefeita.

Vale lembrar que o “Park” servia, na prática, para mascarar a verdadeira intenção da gestão: controlar quase R$ 100 milhões em verba federal. Para justificar o projeto, a prefeitura chegou a declarar ao governo federal que o Armazém, um prédio histórico e ativo, era um “espaço obsoleto” — afirmação que foi desmentida pelo TeatrineTV.

Mesmo assim, Adriane insistiu na licitação do Parque Digital pensando no Armazém, atropelando o apelo popular. No fim, perdeu a disputa: o Armazém permaneceu como espaço cultural por ser um prédio tombado. Já o “Park” se tornou um prédio abandonado na Avenida Rachid Neder, um monumento ao calote cultural e à má gestão.

Entrada do Parketc, localizado no Monte Castelo. Prédio obsoleto é ultilizado, às vezes, para ações do agronegócio.  

Adelaido permaneceu fiel à prefeita até abril de 2024, quando deixou o cargo para tentar uma vaga na Câmara Municipal. Perdeu a eleição, mas, como aliado leal, não ficou sem função: assumiu a presidência da CDL.

Agora, surge novamente em cena para classificar o ato da GCM como agressivo e desmedido — sem citar, em momento algum, a responsabilidade de Adriane Lopes. Um papel conveniente, que contrasta com o da prefeita, protagonista da violência e, em seu terceiro ano de desgoverno, cada vez mais mergulhando a Cidade Morena no caos e exibindo sua face antidemocrática de extremista de direita.

No fim das contas, Adelaido mostra que deixar a prefeitura não o fez tornar-se infiel à prefeita, e sim o infiltrou como um "bom moço" no setor de comércios da Capital sul-mato-grossense.  

PONTO DE INFLEXÃO

(11.dez.23) - Manifestação de agentes culturais contra o calote de R$ 12 milhões nos editais da cultura aplicados pela prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP). Foto: Tero Queiroz

O setor cultural de Campo Grande, embora exausto e hoje menos mobilizado, precisa reconhecer o sinal emitido pelos manifestantes que foram às ruas e sofreram agressões físicas ao defenderem seus direitos.

Trabalhadores da Cultura, este é um ponto de inflexão: enquanto a cidade vive sob decisões cada vez mais alinhadas ao campo conservador, a reação coletiva torna-se não apenas necessária, mas urgente. A ausência de unidade tem custado caro — e pode custar mais. Reunir forças é o único caminho para conter um ciclo de gestão que avança sem diálogo, sem transparência e tomada pelo extremismo de direita.

É hora de decidir se o setor cultural seguirá espectador ou retomará o protagonismo na luta.