
Com uma programação que atravessa o Brasil e mergulha na diversidade das artes, teve início neste mês de maio a 6ª edição da Temporada Sucata Cultural, promovida pelo Instituto de Desenvolvimento Artístico e Social Sucata Cultural, em Dourados (MS). O evento segue até agosto com atividades semanais gratuitas ou a preços populares, incluindo espetáculos teatrais, shows musicais, exposições e ações formativas.
Viabilizado com apoio da Lei Paulo Gustavo, o projeto recebeu mais de 47 inscrições de artistas de diversas regiões do país. Foram selecionados quatro espetáculos teatrais, quatro shows e quatro exposições. A curadoria priorizou diversidade estética e representatividade, com produções LGBTQIAPN+, artistas negros e linguagens híbridas que mesclam dança, circo e tecnologia.
João Rocha, sócio-fundador do Sucata Cultural, destaca o propósito da iniciativa: “A proposta da Temporada Sucata Cultural é voltada principalmente para a valorização da produção cultural local e regional, com foco nos trabalhos de grupos e artistas que já vêm com continuidade, mas sempre dando espaço para novos artistas”.
A abertura oficial ocorreu em 9 de maio com apresentações que definiram o tom da edição: show da cantora douradense Giani Torres, a exposição “Corpo e Manifesto”, do Coletivo Dorcelina Folador (Campo Grande/MS), e o espetáculo “Fruto”, solo de João Dias com direção de Társila Bonelli. Ainda em maio, o público poderá conferir “Tudo se acaba em ferrugem e solidão”, com Lucrécia Prieto, nos dias 17, 24 e 31.

Esta edição também conta com a participação de artistas do Pará e São Paulo, trazendo espetáculos de circo que evidenciam as particularidades culturais de cada estado. “A gente entende como uma parte importante abrir espaço para novos territórios culturais. Essa fluidez de artistas promove o diálogo e a mobilidade cultural entre os estados”, afirma Rocha, que reforça: “A curadoria sempre leva em consideração esse pensamento de dar voz, principalmente para os artistas regionais, mas sempre abrindo espaço para a gente não ficar fechado dentro de uma perspectiva única".
O diferencial da Temporada está na continuidade da programação. “A Temporada Sucata Cultural é considerada uma das principais estratégias que o Sucata Cultural utiliza para formação de um público. A gente entendeu ao longo desses 8 anos de instituição, somando com mais algum tempo de estrada — são 15 anos ao todo — que apresentações sazonais não favorecem a formação de público. O público tem que ter o acesso à cultura dentro do seu cotidiano”.
Segundo Rocha, o evento oferece uma opção cultural permanente à comunidade: “Como já realizado em outras edições do Sucata Cultural: oito meses ininterruptos de arte todos os finais de semana dentro do espaço e dentro da cidade, reverberando de forma muito positiva, tanto na fluidez quanto na apreciação estética do trabalho”.
A proposta também visa fomentar trocas entre artistas de diferentes regiões. “A gente reserva um total de espaço dentro da programação para que a gente possa trazer essas pessoas também como uma forma de troca, de imersão, da fluidez de produtos, artistas em outros lugares, também para que essas pessoas possam vir promovendo assim o diálogo e a mobilidade cultural de outros estados. E inclusive, nessa edição a gente tá recebendo dois estados brasileiros, que são Pará e São Paulo, com espetáculos de circo — cada um com a sua referência. A gente considera ser um momento importante, uma vez que a circulação nacional está cada vez mais difícil”.
A metodologia da Temporada Sucata já rendeu reconhecimento nacional. “Isso é um mecanismo que a gente considera importante e que inclusive foi ele que nos levou para o Mercado das Indústrias Culturais do Brasil, para apresentar essa metodologia, que em mão dupla ajuda tanto o público ter uma opção de cultura — imagina que durante um mês ele pode se organizar para vir ao teatro, convidar os amigos, ajudar na divulgação — e, principalmente, para o espetáculo. Uma vez que em Mato Grosso do Sul não há temporadas de teatro, eu acho que a Temporada Sucata é a única mostra, ou iniciativa, que promove a questão da temporada".
Esse formato garante tempo de cena para grupos e coletivos. “Tanto teatro, dança, circo, têm a possibilidade de ficar em cartaz durante um mês, refinando, experimentando novas perspectivas dentro do mesmo trabalho”.
A curadoria deste ano recebeu mais de 40 propostas. “Para nós é uma vitória, dentro do Mato Grosso do Sul e de outros estados. Isso mostra a vontade dos grupos de se apresentarem, mesmo com pouca verba de financiamento”, diz Rocha.
Entre os destaques estão um espetáculo protagonizado por artistas LGBT+ e produções audiovisuais de coletivos negros. “A gente tá tentando, de uma maneira ampla, trazer toda a diversidade das linguagens artísticas para dentro do espaço — tanto enquanto discussão, quanto enquanto estética”.
A seleção considera tanto critérios artísticos quanto técnicos, respeitando a estrutura oferecida pelo espaço. “Analisamos grupos que misturam dança e circo, dança e tecnologia, teatro e performance. A curadoria sempre é feita por duas pessoas do Sucata e mais um convidado. Neste ano foi a Tati Varela, do Ponto Áureo. Também levamos muito em conta o que cabe dentro do nosso espaço, para oferecer a melhor estrutura possível. Como é um espaço independente, isso pesa”.

Rocha afirma que o conceito da curadoria é político: “De trazer grupos que têm representatividade, que têm trabalhos, e que a gente perceba que têm vontade de reverberar dentro do nosso espaço para a nossa comunidade. O espaço, desde o início, já traz, em sua síntese, a diversidade de linguagens como uma proposta”.
Ele reforça: “A curadoria visa principalmente ser diversa, representativa e com linguagem, porque a gente entende que está em Dourados, que é um público que ainda precisa de muita arte no seu cotidiano. Assim, vamos conquistando afinidade estética com esse público”.
A acessibilidade é uma prioridade. “A gente tem muito trabalho com a comunidade surda. Os espetáculos e shows são pensados com acessibilidade. Inclusive, temos um canal de comunicação específico com a comunidade surda para teatros acessíveis, criado em uma das edições da Temporada Sucata Cultural. A gente tenta pensar em todos esses públicos”.
Para Rocha, o desafio é constante: “Não existe uma receita para se fazer uma curadoria de um festival que tenta permanecer de forma não sazonal. Isso muda com a dinâmica política do tempo e com a estética. Trabalhamos para manter os trabalhos atualizados e, ao mesmo tempo, preservar essas linguagens enquanto história, cotidiano e futuro”.

Rocha destaca ainda o papel das políticas culturais. “A lei [Paulo Gustavo] foi uma força muito grande no levante da arte e da cultura. É fundamental para que a população possa ter momentos de lazer, de reflexão e pensamento crítico. A arte cumpre um papel social essencial dentro de uma sociedade mais crítica, saudável e unificada — através do amor, da sensibilidade e do pensamento”.
As atividades acontecem na sede do Instituto Sucata Cultural, espaço multifuncional com teatro para 100 espectadores, área de exposições, biblioteca e o espaço “Lá No Jardim”, dedicado à gastronomia e apresentações ao ar livre. A acessibilidade está garantida: todos os shows terão tradução em Libras e pelo menos uma sessão de cada espetáculo contará com interpretação simultânea.
SERVIÇO
Local: Instituto Sucata Cultural - R. Onófre Pereira de Matos, 815 - Centro, Dourados (MS).
️ De maio a agosto de 2025.
️ Programação gratuita ou com ingressos populares.
Mais informações: sucatacultural.org.br.