Emy Santos, professora, multiartista e pesquisadora, se apresenta como uma voz potente que tem rompido silêncios históricos em Mato Grosso do Sul, figurando entre as personalidades que buscam mudar os ares do cenário político local.
A 1ª parte da entrevista dela no Estudiozim do TeatrineTV foi ao ar em 10 de maio desse ano (assista aqui). Nela Emy apresenta suas origens e o filme 'Coragem', que aborda sua vida pessoal e profissional.
Já esta 2ª parte de entrevista vai ao ar às 18h desta 5ª feira (10.jul.25) — assista no topo. Agora, Emy comenta com firmeza o ataque transfóbico que sofreu do deputado estadual João Henrique Catan (PL-MS).
Segundo Emy, o ato do parlamentar sul-mato-grossense, que tentou deslegitimar seu trabalho como educadora e mulher trans, foi um estopim — mas também um catalisador de apoio coletivo e fortalecimento político.
Segundo Emy, o deputado, que se autodeclara conservador, bolsonarista, cristão e armamentista, se enganou ao direcionar ataques à sua trajetória achando que a prejudicaria. “Ele deu um tiro que saiu pela culatra”, afirmou. “Ele não imaginava o meu tamanho e tudo que eu estou me tornando”, completou.
MOBILIZAÇÃO COLETIVA
O ataque de Catan, que ganhou repercussão nas redes sociais, evidenciou a tensão existente entre instituições políticas tradicionais e grupos que historicamente tiveram acesso restrito a determinados espaços.
Emy respondeu ao episódio afirmando que a reação do deputado atingiu outras pessoas além dela. “Ele atirou uma pedra em mim, mas atingiu uma série de pessoas. E isso não tem preço que pague”, disse. “Quantas outras pessoas trans e travestis eu inspirei? Quantas educadoras ficaram do meu lado?”, questionou.
Para Emy, a resposta ao ataque reflete uma mobilização coletiva que vai além do âmbito individual, envolvendo outras pessoas trans, professoras, pesquisadoras e artistas que, segundo ela, enfrentam desrespeito, invisibilidade e violência institucional.
UM PROJETO QUE DÁ CERTO
Além do episódio envolvendo o deputado, a entrevista aborda a trajetória de Emy Santos como mulher trans negra que foi beneficiada pelas políticas de cotas, as quais ela defende.
Emy afirmou que as cotas tiveram impacto significativo em sua vida. “Eu poderia ter ido para a marginalidade, para a prostituição, para o vício — caminhos que empurram para o nosso corpo. Mas a universidade me salvou”, disse a educadora.
Segundo Emy, as ações afirmativas que buscam reduzir desigualdades estruturais no Brasil possibilitaram sua entrada no ensino superior por meio do sistema de cotas, que tem como objetivo ampliar o acesso a grupos historicamente excluídos. “As cotas são uma reparação histórica”, explicou. “Não começamos do mesmo lugar. É injusto competir sem equidade. A política de cotas permite que pessoas como eu ocupem espaços de conhecimento, decisão e transformação.”
TRANSFOBIA INSTITUCIONAL
Ao questionar o trabalho de Emy, o deputado Catan não atacou apenas uma educadora, mas, segundo ela, também escancarou 'um modelo de sociedade'. A tentativa de silenciá-la, segundo Emy, evidencia a resistência que a presença de pessoas trans enfrenta em um sistema que, na visão dela, ainda opera com base em exclusão e privilégios.
“Se ele sentiu medo, se sentiu incomodado, continue sentindo. A gente não veio a passeio”, afirmou Emy. “Eu sei o que eu vim fazer aqui. E se está incomodando pessoas como ele, vai incomodar muito mais.”
Ela destacou a importância do reconhecimento como sujeito político e da participação ativa na ocupação e transformação dos espaços. “Não tem nada de nós sem nós”, afirmou. “Se a gente não estiver ali para discutir, negociar, propor — outras pessoas vão fazer por nós. E nem sempre do nosso lado.”
CULTURA, EDUCAÇÃO E AFETO COMO REVOLUÇÃO

A trajetória de Emy envolve atuação em diferentes áreas, como a sala de aula, o palco e espaços políticos. Ela relaciona sua arte à militância, e esta, por sua vez, à pedagogia, destacando a cultura, o afeto e o conhecimento como bases de sua atuação.
Como adiantamos na primeira parte da entrevista, Emy é idealizadora da Coletiva de Trans Pra Frente, um grupo formado majoritariamente por pessoas trans negras que desenvolve projetos de arte, cultura e educação no estado, área em que, segundo ela, não existiam iniciativas semelhantes.
Ao ser questionada sobre suas referências, Emy mencionou sua mãe e avó, mulheres negras que, segundo ela, enfrentaram dificuldades e limitações. “Agora eu sonho por elas. E por todas as minhas”, afirmou.
“ORGANIZEM A REVOLTA DE VOCÊS”
Emy demonstra consciência sobre o papel que desempenha e o impacto que pretende ampliar. Ela considera a organização popular como uma estratégia fundamental para enfrentar estruturas de poder estabelecidas.
“Essa galera tem dinheiro, tem projeto, tem articulação. E a gente? A gente tem que organizar a nossa revolta”, afirmou. “Não adianta só gritar. A gente precisa construir, formar as nossas lideranças, ocupar os espaços”, acrescentou.
Segundo sua trajetória, o ataque do deputado não foi suficiente para deter sua atuação. Para Emy, as tentativas de silenciamento não superam a força de uma mobilização coletiva em movimento.
O AMANHÃ É GRANDE
Emy comentou sobre o motivo pelo qual acredita ser alvo da extrema direita em Mato Grosso do Sul: “Acho que ninguém ataca aquilo que não brilha”, afirmou.
Com novos projetos audiovisuais em andamento, viagens nacionais e internacionais programadas, e uma crescente articulação política, Emy mantém sua atuação. “Quero que lembrem de uma travesti negra do Mato Grosso do Sul que está fazendo história. Que saiu das margens e foi para o centro do debate”, disse.
Emy atua como educadora, artista, pesquisadora e liderança política. Sua fala inclui um convite à reflexão e à ação coletiva: “A gente tem que transicionar nossas ideias. Entender que podemos sim transformar o mundo coletivamente.”
SERVIÇO
A 2ª parte da entrevista com Emy Santos vai ao ar nesta quinta-feira (10.jul.25), às 18h, no canal do TeatrineTV no YouTube.
Para acompanhar, siga Emy nas redes sociais: @afro_queer e @professora.emy. Acompanhe o TeatrineTV no Instagram @teatrinetv.