A jornalista, gestora cultural e ativista humanista Marielle Ramires, uma das fundadoras do Mídia NINJA e do coletivo Fora do Eixo, faleceu na terça-feira (29.abr.25), aos 45 anos, após uma luta contra o câncer no estômago. Diagnosticada há oito meses, ela enfrentou complicações decorrentes da quimioterapia e não resistiu.
Em dezembro de 2024, Marielle compartilhou com seus seguidores o diagnóstico de câncer e a luta que enfrentava. Em uma postagem, ela revelou: "Nunca pensei que ficaria careca. Não por um motivo assim".
Natural de Cuiabá (MT), Marielle será velada entre às 20h de sexta-feira (2.mai.25) e 14h de sábado (3.mai.25) na sala Orquídeas da Capela Jardins, em Cuiabá. O sepultamento ocorrerá às 15h de sábado, no Cemitério Parque Bom Jesus, também na capital mato-grossense.
Marielle Ramires desempenhou um papel fundamental na transformação da comunicação independente no Brasil. Como uma das principais articuladoras do Mídia NINJA, ela contribuiu para a criação de uma rede de jornalistas e comunicadores que atuam de forma colaborativa e descentralizada, desafiando os modelos tradicionais de mídia. Além disso, foi cofundadora do coletivo Fora do Eixo, que promoveu a articulação de coletivos culturais e movimentos sociais em diversas regiões do país.
Sua atuação não se limitou ao Brasil. Marielle também esteve envolvida em iniciativas internacionais, como o apoio ao Congresso da Aliança das Comunidades Indígenas da Indonésia (AMAN) e a coordenação de missões de cobertura de mobilizações indígenas em países da América Latina.
O trabalho dela foi reconhecido por organizações como o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Ministério da Cultura do Brasil. O MinC, inclusive emitiu uma nota de pesar (aqui), em que destaca que Marielle como "Defensora das políticas culturais do Brasil, foi assessora especial do MinC durante a gestão de Juca Ferreira. Atuou durante anos na defesa dos povos indígenas em fóruns nacionais e internacionais".
Marielle também foi homenageada na exposição "Rosas em Vida", do Festival Latinidades, que reconheceu sua trajetória ao lado de outras 99 mulheres afro-latinas de destaque. A mostra abordou temas como negritude, antirracismo, ancestralidade e diversidade sexual. Em sua participação, Marielle expressou honra por estar entre as homenageadas e agradeceu pelo reconhecimento de seu trabalho coletivo.
DESPEDIDAS
O sociólogo e ex-ministro da Cultura disse que Marielle era muito jovem para enfrentar a morte. "Compartilhei com o MÍDIA NINJA algumas batalhas culturais e construímos uma amizade e, da minha parte, uma admiração por este coletivo de ativistas e militantes de boas causas culturais. Compartilhei com Marielle muitos momentos na mesma trincheira, militando em algumas dessas boas causas, lado a lado, e assim passei a ter por ela uma grande admiração e afeto. Marielle combinava doçura e firmeza, serenidade e sentimento de urgência, e seu compromisso com as causas que abraçava, como a luta dos povos indígenas, era de uma força que impressionava e nos fortalecia a todos". Juca ainda grifou: "Viva Marielle!".
Além disso, Marielle coordenou a agenda da campanha presidencial de Sônia Guajajara em 2018, quando a líder indígena se tornou a primeira mulher indígena a concorrer à presidência no Brasil. A ministra também publicou uma mensagem de pesar em que classifica Marielle como parente: "Mais que uma amiga, Mari foi uma irmã! Sempre foi uma de nós, uma mulher semente que tanto semeou revolução com coragem e criatividade. Mari, você me inspirou, me orientou, me acompanhou… Não só me mostrou caminhos, mas pegou na minha mão e seguiu comigo por tantos lugares. Você deixa um legado de cuidado com as pessoas, de carinho, companheirismo e construção coletiva. Obrigada por tanto! Não tem nada que eu possa falar hoje que dê conta de representar o respeito e o amor que sinto por ti, muito menos expressar a dor que sinto agora. Ou a saudade que vou sentir para sempre. Sua memória é eterna na minha vida. Vai com Deus, minha irmã!".
A presidenta da Fundação Nacional das Artes (Funarte), Maria Marighella disse: "Mari, Marielle Ramires, mulher de tanta coragem e lutas necessárias e urgentes, ativista da cultura, do clima e dos direitos indígenas. Estivemos juntas no Ministério da Cultura em 2015, quando construímos uma importante parceria no primeiro ciclo do processo de construção da Política Nacional das Artes. Uma despedida tão sentida para quem muito contribuiu para a democracia brasileira, a mídia livre e os circuitos independentes da música no Brasil. Viva Mari e sua imensidão. Que a sua generosidade, horizonte e utopia sigam sendo chão dessa nossa travessia. Meu abraço profundo a toda Mídia Ninja, à rede de coletivos de ativistas e produtores culturais Fora do Eixo, seus amigos e familiares".
O amigo, fotógrafo e editor do MídiaNinja, Oliver Kornblihtt, fez um texto repleto de afeto em despedida a amiga e compartilhou em seu Instagram, numa carrossel de fotos dela. "Você não imagina, Mari, o impacto que teve e tem na minha trajetória: o quanto me fez crescer, o quanto me apoiou, me defendeu, me provocou e me ensinou (...). Mari, caralho, o nível da sua entrega é imenso! É algo tão grande que inspira todos nós".
Ele disse ainda que ela mudou o mundo com amor e liderança. "Me ensinou a manter a leveza sem perder a ternura: ‘Oli, para de ser dramático! Vamos com leveza.’".
Oliver ainda comentou sobre a força de Marielle no enfrentamento a doença. "Até o último momento: com sangue nos olhos e sede de vida".
Ele ainda destacou a profunda influência positiva dela. "A tua determinação me provoca, Mari. Uma manada de búfalos em disparada, me empurrando pra frente. A tua ausência vai ser um oceano profundo e infinito. Mas a tua presença, Mari… a tua presença vai ser o vento leve que nos empurra pra seguir andando. Pra continuar voando juntos... feitos borboleta".
A Articulação dos povos indígenas do Brasil (Apib), disse que a cuiabana era uma aliada que 'ancestralizou'.
O MídiaNinja disse:
“Hoje, nos despedimos de Marielle Ramires, força da natureza, uma das nossas principais fundadoras, fundamental desde os primeiros passos da @midianinja e do @foradoeixo.
Nascida em Cuiabá, Marielle atravessou fronteiras, conquistou o mundo e nos ensinou o verdadeiro significado de coragem e revolução.
Ela partiu da mesma forma que viveu: lutando e inspirando, com fé até o último momento.
Sua trajetória de luta por justiça social e climática é um testemunho de compromisso inabalável com as causas que acreditava.
Mari se despede após uma luta contra o câncer, mas seu legado segue vivo e mais forte do que nunca. Sua passagem marca o nascimento da nossa ancestralidade.
Guardaremos suas palavras:
‘A esperança é uma moça teimosa
que insiste
organicamente em se renovar
com a gente ou apesar da gente.Só uma coisa é certa:
o mato voltará a crescer.
Com o tempo.’Marielle Ramires é eterna. Por ela, lutaremos sempre".