
Desde a 2ª feira, 30 de junho de 2025, sites e blogs de jornalismo sul-mato-grossense estão veiculando uma mentira: a de que a prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes (PP), teria destinado R$ 100 mil em verba pública “para um musical LGBT”.
A informação falsa foi publicada, primeiramente, no TopMídia News (aqui), assinada pelo jornalista Thiago de Souza e no dia seguinte no Blog do Nélio (aqui
). Em seguida, a mentira também foi veiculada em sites menos conhecidos, como O Sul-Mato-Grossense (aqui), em que o jornalista João Paulo Ferreira assina a autoria (alvejando-se a si mesmo profissionalmente falando) e no Dourados Oline (aqui)
Já é de conhecimento público que o jornalismo do estado pouco compreende de legislação cultural e dos deveres no conjunto da política pública cultural, mas é bastante curioso ver vários veículos passando essa vergonha coletiva.
Vamos aos fatos:
Conforme as "notícias", a prefeita teria destinado o valor acima mencionado, por escolha própria, para um festival LGBTQIAPN+.
É tanta mentira em uma só linha que chega a ser difícil explicar — mas vamos lá. Primeiro, a prefeita não destinou nenhum recurso, pois sequer tem conhecimento da existência de uma iniciativa como o Cinema da Boca: Mostra Musical LGBTQIAPN+, aprovada por meio de edital do Fundo de Investimentos Culturais (FMIC) de 2024. O recurso é oriundo da verba prevista na Lei Orçamentária Anual, que deveria ter sido investida em 2024 na cultura da capital. No entanto, devido à má gestão de Adriane Lopes, o edital está sendo pago de forma parcelada (no estilo Casas Bahia) e deve se arrastar até o final de 2025.
E como mostramos aqui, a prefeitura lançou os certames do FMIC e da Política de Fomento para o Teatro (FOMTEATRO) no eleitoral (2024), após deixar de investir R$ 12 milhões do orçamento cultural de 2022 a 2024.
Diferentemente do que sugerem os textos veiculados, os projetos do referido edital artístico-cultural são analisados por pareceristas especializados em cada linguagem artística e somente gerenciados pela atual Fundação Municipal de Cultura (Fundac). Ou seja, os sites mentem ao insinuar que é a chefe do Executivo quem “bate o martelo” sobre qualquer seleção. 'Suponhamos, por ventura, que um dia a prefeita interferisse na escolha dos projetos aprovados em editais culturais' — os órgãos de controle certamente interviriam no certame.
FALTA CONHECIMENTO OU FALTA CARÁTER?

Outra mentira replicada pelos sites é que não se trata de um “festival musical”, e sim sessões cinematográficas de filmes musicais que serão exibidos pelo Cinema da Boca, projeto de cineclubismo fundado por egressos do curso de Audiovisual da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).
Há mais de dois anos, o projeto promove cineclubes, mostras e festivais na cidade. "O Cinema da Boca consiste em um coletivo engajado com a distribuição e acessibilidade de filmes para a população. Ele atua desde 2021, levando a experiência cinematográfica de forma gratuita a espaços públicos e comunidades periféricas, através de recortes curatoriais que se alternam a cada semestre", explicou João Pelosi, um dos fundadores do Cinema da Boca.
João disse acreditar que as matérias veiculadas podem se ancorar na falta de conhecimento proposital dos autores. "O primeiro ponto que acho importante destacar é que há, por parte das matérias, um visível desconhecimento – ou vontade de desconhecer – de como os recursos são distribuídos no orçamento municipal. Nosso projeto de mostra de filmes musicais competiu com diversas outras iniciativas em um edital de fomento público para ações culturais, espécie de concurso em que as ideias mais bem defendidas e estruturadas pontuam e são habilitadas a receber investimentos", explicou.
Ainda conforme o idealizador, a prefeita da Capital, provavelmente, diante da sua pouca afeição aos trabalhadores da cultura, sequer saberia da existência do projeto. "Acredito que a prefeita, pelo descaso com a pasta da cultura, nem sabia da nossa existência. Não é como se ela tivesse escolhido destinar recursos da saúde para uma ação LGBT. Nesse sentido, é engraçado pensar que, justamente por ignorar uma classe, ela acabou perdendo apoio dos próprios pares por, supostamente, acenar a pautas progressistas", apontou.
O temor, na opinião do trabalhador da cultura, é que o discurso mentiroso afete a execução da proposta artístico-cultural. "Nos preocupa que os discursos fabricados através das matérias em questão colaborem para a inviabilização do recebimento dos recursos para a execução do nosso projeto. Recursos estes, inclusive, cujo repasse já está atrasado há meses. Esperamos que a Secretaria de Cultura honre com os compromissos e não seja induzida a suspender o processo legal por conta de pressões políticas", disse.
A mostra de musicais LGBT é o primeiro evento com temática progressista abordado pelo Cinema da Boca. Eles já haviam realizado mostras de terror, faroeste, cinema japonês, filmes regionais e cinema brasileiro. "Para que os interessados conheçam o nosso trabalho, basta acompanhar o Instagram @abocacine", completou João.
VIÉS HOMOFÓBICO E DESINFORMAÇÃO
A forma como os sites apresentaram a matéria, usando o termo “musical LGBT” de modo pejorativo e associando o projeto cultural a uma suposta negligência da gestão pública em outras áreas, revela intenção de desqualificar um projeto sério por sua temática e por seus beneficiários.
Trata-se de uma tentativa de promover desinformação, estimular preconceito e atacar uma parcela da população por sua sexualidade e gênero — algo que configura discurso homofóbico e contraria os princípios do jornalismo ético e responsável.
DIVERSIDADE É POLÍTICA PÚBLICA
Ademais, o Cinema da Boca é uma iniciativa cultural consolidada, que nesta edição promove filmes que , voltados à visibilidade de artistas e temas ligados à comunidade LGBTQIAPN+ — grupo historicamente marginalizado e amparado por políticas públicas de inclusão e representatividade.
Todo e qualquer jornalista minimamente embasado por dados históricos sabe que promover a diversidade não é gasto supérfluo, é obrigação constitucional.
A cultura é um direito garantido por lei, e o financiamento público de iniciativas culturais diversas faz parte de um compromisso nacional com a cidadania e os direitos humanos.
O investimento na cultura, sobretudo em segmentos que enfrentam barreiras históricas de acesso, é uma política de Estado e não uma decisão pessoal ou política de ocasião. Os recursos do FMIC têm destinação específica (conforme a LOA) e não podem ser desviados para outras áreas, como saúde ou infraestrutura, como sugerido erroneamente na matéria.
Ao contrário do que o texto insinua, a existência de desafios em outras áreas da gestão municipal não justifica o abandono ainda maior cultura, especialmente quando se trata de políticas afirmativas construídas com base na escuta pública e com aprovação de conselhos culturais.
INSATISFAÇÃO COM A GESTÃO EX-AMIGA
Vale lembrar que o Top Mídia News apoiou, nas eleições de 2024, a candidata derrotada Rose Modesto. Desde então, o site perdeu os contratos de mídia com a prefeitura de Campo Grande. Então, não é surpresa — embora não devesse ser assim — que estejam partindo para o ataque contra Adriane Lopes, adversária política que, com certeza, vai virar alvo de matérias tendenciosas nos próximos anos.
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Mas, olha só: os trabalhadores da cultura são os profissionais de um dos setores que mais sente o peso da má gestão de Adriane. O que fica é que, em vez de baterem na prefeita atacando a cultura, esses sites deveriam entender que os artistas e produtores culturais já estão no prejuízo por causa dela.
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Além disso, arte e cultura não deveriam entrar nessa disputa política partidária.
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